quinta-feira, 11 de junho de 2015

Coluna Nutrição - Whey Protein e outros suplementos proteicos



Whey Protein e outros suplementos proteicos

Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira

Suplementos à base de proteína estão entre os mais comercializados no Brasil (1). A razão é que estes produtos podem estar mais diretamente associados ao ganho de músculos, juntamente com os carboidratos. Segundo a legislação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)(2), para que o suplemento possa ser considerado proteico, deve conter proteína de alta digestibilidade, rica em aminoácidos essenciais. Além disso, o produto pronto para consumo deve conter no mínimo 10 g de proteína na porção, devendo corresponder a 50% do valor energético total do produto.
O consumo de proteína é essencial não só para ganho de músculos, mas também para produção de hormônios, enzimas, estrutura celular e de todos os tecidos. Para a população adulta, saudável e não atleta, recomenda-se que 15 a 20% do requerimento energético total do indivíduo seja proveniente de proteína, o que equivale a 75 a 100 g de proteína numa dieta de 2000 Kcal/dia (3) ou ainda 0,8 g/Kg de peso corporal (4). Àqueles praticantes de exercício físico regular, incluindo atletas, a recomendação proteica pode variar de 1,0 a 2,0 g/Kg/peso corporal ao dia (4), dependendo da necessidade energética associada ao tipo de treino. O profissional habilitado para avaliar as necessidades proteicas individuais é o nutricionista.

Quando, no entanto, o indivíduo, seja ele atleta ou não, não consegue ingerir proteína em quantidade adequada por meio dos alimentos convencionais, pode-se recorrer ao consumo de suplementos. Segundo a legislação brasileira, suplemento proteico significa “produto destinado a complementar as necessidades proteicas”(2).

Quando recomendado por nutricionista, o consumidor deve ser orientado para o momento da compra do suplemento, pois muitos se veem perdidos frente a muitas opções de produtos, seja no tipo de proteína, como na forma de consumo, cápsula, comprimido, líquido e pó. No mercado, existem diversas opções de tipos de proteína, prevalecendo as de origem animal. As proteínas são: carne bovina em pó, proteína de soro do leite ou whey protein (derivada do leite), caseína (derivada do leite), albumina (derivada do ovo), colágeno ou gelatina (origem bovina), proteína da soja e proteína da quinoa (origem vegetal). Todas estas opções, com exceção do colágeno e gelatina, são proteínas de alto valor biológico. O colágeno e gelatina, no entanto, além de proporcionarem digestibilidade ruim, contém baixo teor de aminoácidos essenciais. A proteína do soro do leite é a melhor proteína, pois além de sua fácil digestão, contém maior quantidade e variedade de aminoácidos essenciais (6).
Quando no momento da compra, o consumidor deve estar atento às informações nutricionais nos rótulos dos suplementos e avaliar quatro variáveis: qualidade da proteína, preço do produto, teor de proteína na porção e peso líquido total. Observe o caso abaixo.


Após observar a figura acima, qual seria a melhor opção de compra?

Observe que o suplemento B contém mais proteína, é mais barato e possui maior quantidade na embalagem. Isso já seria necessário para a sua escolha? Não. Analise os pontos discutidos a seguir:

O produto A contem somente whey protein e o produto B contém mistura de proteínas. De acordo com a ordem em que são descritos os nomes dos ingredientes, o que vem primeiro significa que está em maior quantidade no produto. Portando, no produto B, a soja é a proteína que, teoricamente, está em maior quantidade, seguida de colágeno e whey protein. Conclui-se, então, que o produto A contém somente proteína de maior qualidade.

Atente-se que o produto A contém mais proteína do que o B, pois a porção do produto B é quase o dobro (60 g do produto para adquirir 30 g de proteína). Supondo que o consumidor consuma duas porções diárias de suplemento, o produto A duraria 24 dias e o produto B duraria 17 dias. Ou seja, embora o suplemento B seja mais barato, além de conter maior quantidade do produto por embalagem, o custo mensal é mais elevado e em sua composição há proteínas de baixo valor biológico. Isso não significa que o mais caro seja sempre melhor. Isso não é uma regra. Algumas vezes, ocorre o contrário. Basta fazer as contas.

No mercado são normalmente encontrados três tipos de whey protein: isolada, hidrolisada e concentrada. A escolha destes confunde muita gente. Mas qual a diferença entre elas?

Não há na legislação brasileira e internacional regulamentações sobre estas definições. Mas pode-se afirmar que, de praxe, a isolada deve possuir somente proteína do soro do leite, sem conter em sua composição outros nutrientes que não sejam proteína. A hidrolisada deve conter somente proteína do soro do leite, no entanto, neste caso, a proteína está mais fragmentada ou hidrolisada (que significa ser de mais fácil digestão). A  concentrada, por fim, deve conter somente proteína do soro do leite, mas pode conter outros nutrientes em sua composição, como carboidrato, gordura, vitaminas e minerais. Estudos mostram que o consumo de whey protein hidrolisada pode resultar em maior ganho de massa muscular em comparação com as demais (5, 7). Todavia, fora dos controles científicos, seguramente, não é possível afirmar qual o melhor produto, pois a forma de consumo, horário e quantidade influenciam no resultado final. Mais uma vez, ressalta-se importância da condução dietética ser dirigida por nutricionista, a fim de maximizar os efeitos.

Tipos de whey protein comercializada: isolada, concentrada e hidrolisada.

Outra pergunta que muita gente faz é: será que a quantidade de proteína ofertada no rótulo do produto condiz com o que realmente existe dentro dele? Fiscalizações realizadas pela Anvisa mostraram que nem todos os fabricantes cumprem o que prometem nos rótulos de seus produtos, e alguns comercializam suplementos com quantidades proteicas bem abaixo do que é propagado (com variação acima de 20%, conforme previsto por norma). Essa prática pode acarretar à empresa advertência, apreensão e inutilização, interdição e ou multa, que pode variar de R$ 2000,00 a R$ 1.500.000,00. Em 2014, a Anvisa analisou 25 marcas de suplementos e proibiu a comercialização de 20, em virtude de tais irregularidades. Os resultados você pode encontrar acessando este link: http://s.anvisa.gov.br/wps/s/r/cW3N.

REFERÊNCIAS

1. SILVA LFM, FERREIRA KS. Segurança alimentar de suplementos comercializados no Brasil. Rev Bras Med Esporte , 2014, 20(5): 374-378. BRASIL. (2008b) Consulta Pública n. 60, de 13 de novembro de 2008. Regulamento Técnico de Alimentos para Atletas. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 nov. 2008.
2. BRASIL. Consulta Pública n. 60, de 13 de novembro de 2008. Regulamento Técnico de Alimentos para Atletas. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 nov. 2008.
3. Reis NT, Calixto-lima, L. Nutrição Clínica. Bases para prescrição. Rio de Janeiro. Ed. Rubio. 2014. 474p.
4. Campbell B, Kreider RB, Ziegenfuss T, Bounty PL, Roberts M, Burke D, Landis J, Lopez HM, Antonio J. International Society of Sports Nutrition position stand: protein and exercise. Journal of the International Society of Sports Nutrition 2007. 4(8):7.
5. Hulmi JJ, Lockwood CM, Stout JR. Effect of protein/essential amino acids and resistance training on skeletal muscle hypertrophy: A case for whey protein. Nutrition & Metabolism 2010, 7(51):2-11
6. Silva LFMS. Avaliação de suplementos alimentares para fins especiais. Dissertação (Mestrado em Produção Vegetal) – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias. Campos dos Goytacazes, RJ, 2010.
7. Tang JE, Moore DR, Kujbida GW, Tarnopolsky MA, Phillips SM. Ingestion of whey hydrolysate, casein, or soy protein isolate: effects on mixed muscle protein synthesis at rest and following resistance exercise in young men. J Appl Physiol. 2009.107(3):987-92.
8. BRASIL. Agência Nacional de Vigilânia Sanitária. Anvisa proíbe 20 lotes de Suplementos Proteicos para Atletas. Disponível em http://s.anvisa.gov.br/wps/s/r/cW3N. Data de acesso: 28/04/2015.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Coluna Nutrição: Suplementos alimentares



Suplementos alimentares

Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira

A indústria de suplementos alimentares, com exceção dos alimentos funcionais, fatura anualmente mais de 46 bilhões de dólares no mundo (1). Ainda que bastante difundidos nas academias e clubes esportivos, muitos desses produtos são consumidos sem orientação adequada, o que pode resultar em desperdício financeiro e, em alguns casos, efeitos indesejáveis na saúde em função do consumo excessivo. Quando bem orientada, entretanto, a ingestão de suplementos é benéfica, contribuindo para ganho de massa muscular, perda de gordura e aumento de desempenho durante o exercício.

A recomendação de suplemento deve ser realizada, de preferência, por nutricionista, pois a prescrição correta precede de avaliação nutricional e planejamento dietético, que devem estar em consonância com o tipo de exercício praticado, duração e intensidade. Se isso não for feito, o esportista pode perder massa muscular com mais intensidade, engordar e até se sentir mal durante o exercício (tontura, náuseas, vômitos e desmaios).

Existem diversos suplementos alimentares comercializados no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamenta e classifica os suplementos de acordo com a finalidade proposta pelo fabricante. São eles:

1) Suplementos hidroeletrolíticos - têm por finalidade a hidratação, diferindo dos demais suplementos pela capacidade de serem mais rapidamente absorvidos, não servindo para a reposição de minerais (3).
2) Energéticos - chamados de hipercalóricos, são a base de pequenos polímeros de glicose (maltodextrina) e fornecem glicose para produção de energia;
3) Suplementos contendo somente cafeína - aceleram o metabolismo, mas não fornecem energia, porque não contêm nutrientes energéticos em sua composição (carboidratos, lipídios e proteínas).
4) Substituidores parciais de refeição (conhecidos como hipercalóricos) - são mais completos, pois podem fornecer proteínas, carboidratos, lipídios, minerais, vitaminas e fibras alimentares. Há shakes no mercado que fornecem quantidade muito baixa de energia, abaixo de 300 Kcal/porção, e por isso não podem ser considerados substituidores de refeição.
5) Produtos à base de creatina - têm a função de melhorar o desempenho em exercícios de curta duração e de alta intensidade (ex.: corrida de 100 metros, musculação), pois fornecem aos músculos, em condição anaeróbica, reserva de fosfato, que culmina em alta carga energética ao músculo para realização do movimento de explosão.
6) Produtos proteicos -  podem ser à base de soja, proteína do soro do leite, caseína, derivados de carne bovina e albumina. Para serem consideradas fontes de proteína, os produtos devem possuir, no mínimo, 10 g de proteína na porção.

Embora estes produtos sejam regulamentados para fins atléticos, muitos indivíduos que não são atletas, mas que praticam exercício físico regularmente e que não se alimentam adequadamente, podem consumir estes suplementos para melhorar o desempenho físico, aumentar os músculos e reduzir a gordura corporal.



Infelizmente, muitas empresas comercializam suplementos com promessas de emagrecimento e hipertrofia muscular. Não existem alimentos que sejam capazes de promover este efeito por si só. Para que haja perda de gordura corporal e/ou ganho de músculos, é necessário que em conjunto seja realizada planejamento dietético que haja alimentação e atividade física adequadas e prática regular de exercício físico. Sendo assim, a ANVISA proibiu expressões veiculadas em propagandas e embalagens de suplementos, tais como: "anabolizantes", "hipertrofia muscular", “massa muscular”, "queima de gorduras", "fat burners", "aumento da capacidade sexual", “anticatabólico”, “anabólico”, equivalentes ou similares.
O uso de substâncias como o dimetilamilamine ou dimethylamylamine (DMAA) e efedrina, que são potentes estimulantes do metabolismo e que podem causar a morte, são proibidas no Brasil.
Devido a variações na composição das matérias prima erros inerentes aos métodos de análise, a ANVISA permite variação de 20% entre a composição informada na embalagem e a composição real do produto.

REFERENCIAS

1. Maughan RJ, King DS, Lea T. Dietary supplements. J Sports Sci. 2004;22(1):95-113
2. BRASIL. Agência Nacional de Vigilânia Sanitária. Anvisa alerta para risco de consumo de suplemento alimentar. Disponível em http://s.anvisa.gov.br/wps/s/r/1M8. Data de acesso: 26/04/2015.
3. BRASIL. (2008b) Consulta Pública n. 60, de 13 de novembro de 2008. Regulamento Técnico de Alimentos para Atletas. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 nov. 2008.

terça-feira, 28 de abril de 2015

Coluna Nutrição - Lactose – um açúcar que só é fabricado pelos animais mamíferos




Lactose – um açúcar que só é fabricado 

pelos animais mamíferos 


       Karla Silva Ferreira, Luiz Fernando Miranda da Silva e Maicon Martins Teixeira


A lactose é o açúcar do leite. É um dissacarídeo, o que significa que é composta por duas unidades menores – uma glicose e uma galactose. A união destes dois açúcares para formar a lactose ocorre apenas nas glândulas mamárias dos mamíferos. Por este motivo,  a lactose somente é encontrada em leite e alguns de seus derivados.  Entenda-se aqui leite como a secreção das glândulas mamárias de mamíferos. O que chamamos de “leite de soja” não é leite de fato, mas sim extrato solúvel de soja, que, como os demais alimentos de origem vegetal, não possui lactose.


A lactose é solúvel e utilizada por microrganismos para produção de energia. Desta forma,pode ser eliminada na fabricação de alguns tipos de queijo e iogurtes. Os queijos frescos, que possuem mais soro, inclusive o cottage, possuem teores mais elevados de lactose que os queijos maturados e mais secos, nos quais a lactose pode até ser totalmente eliminada. Nos iogurtes, os teores de lactose são variáveis conforme o modo de fabricação e formulação. Em formulações industriais, com a adição de espessantes e pouco tempo de fermentação para a atuação das bactérias lácticas, os teores de lactose são mais elevados. Nos produtos artesanais, cujo processo consiste apenas na fermentação do leite com as bactérias lácticas, os teores de lactose são menores. Nas bebidas lácteas, os teores são também elevados.



Atualmente têm sido encontrados no comércio leites sem lactose. Estes leites são preparados com adição de enzimas (lactases) que hidrolisam a lactose em seus constituintes: glicose e galactose. Alguns destes leites são perceptivelmente mais escuros que os leites comuns. Este fato é devido a uma reação entre açúcares e aminoácidos (constituintes das proteínas) quando o alimento é aquecido — reação de Maillard. Aparentemente, os derivados da reação de Maillard não são prejudiciais para a saúde, pois vêm sendo consumidos destas épocas remotas. Eles são também os responsáveis pelo escurecimento do doce de leite, da crosta do pão e de muitos outros alimentos que se tornam escuros com o aquecimento.



Existem dois tipos de distúrbios relacionados com a ingestão de lactose: intolerância à lactose e galactosemia. E a alergia ao leite, relacionada com um tipo de proteína presente principalmente no leite de vaca.  Para cada um destes distúrbios há um procedimento alimentar específico.


1) A intolerância à lactose é a incapacidade do organismo em hidrolisá-la, separando a glicose da galactose. A quebra da lactose em seus constituintes glicose e galactose (digestão da lactose) deve ocorrer no intestino delgado pelas enzima “lactases”.  Com a atuação desta enzima, a glicose e galactose podem ser absorvidas e utilizadas pelo indivíduo para produção de energia. O organismo não pode absorver a lactose como tal, mas apenas seus constituintes. Em consequência, na intolerância à lactose, esta vai para o intestino grosso, onde é fermentada por bactérias que são habitantes normais desta parte do intestino, acarretando gases, diarreia e dores abdominais. A intolerância á lactose é comum em adultos, principalmente da raça negra, índios e asiáticos. Raramente é encontrada em crianças. Quando ocorre em crianças é devido a infecções intestinais, desnutrição ou consequência da doença celíaca, o que é reversível. Há raríssimos casos de deficiência congênita, isto é, a criança nasce com esta deficiência e não é reversível. A recomendação nos casos de intolerância à lactose é a retirada do leite e derivados contendo lactose da alimentação ou uso de leite e derivados sem lactose ou consumo de pequenas quantidades de lactose associada a outros
alimentos.

2) A galactosemia é uma doença genética identificada logo que a criança nasce. Neste caso, a lactose é digerida, a galactose é absorvida mas não é metabolizada, de forma que se acumula no organismo podendo causar diversos problemas, desde comprometimento mental até a morte. A galactose pode ser encontrada livre em pequenas quantidades em diversos alimentos, mas as principais fontes são o leite e derivados, mesmo o materno e o sem lactose, pois no processo de fabricação do leite sem lactose há apenas quebra da lactose mas não eliminação da galactose. O mel também não é recomendado, pois pode conter em torno de 3% de galactose livre. Neste caso é necessária uma dieta severa, com total restrição de galactose.

3) A alergia ao leite é normalmente a um tipo de proteína presente no leite de vaca. Por este motivo, em muitos casos é feita a substituição do leite de vaca por outro tipo de leite, por exemplo leite de cabra. Entretanto, há casos nos quais é preciso eliminar qualquer tipo de leite da alimentação.

Sempre que possível, é importante manter os laticínios na alimentação, pois são alimentos muito nutritivos. São nossas principais fontes de cálcio, além de conterem altos teores da vitamina riboflavina e serem constituídos por proteína de alta qualidade.

Nos indivíduos com intolerância à lactose, mesmo com os transtornos intestinais, não há comprometimento total na absorção do cálcio, proteínas e vitaminas. Além disso, este grupo populacional foi favorecido com o desenvolvimento da ciência, que possibilitou a fabricação de leite e laticínios sem lactose.

Referências bibliográficas

1. Cox, MM;  Nelson, DL. Princípios de Bioquímica de Lehninger, 5ª edição, Porto Alegre, Artmed, 2011, 1274p.
2. Fennema, OR;  Parkin, KL;  Damodaran, S. Química de alimentos de Fennema, 4ª edição, Porto, Alegre, Artmed, 2010, 900p.
3. Shils, M.E.; Shike, M.; Ross, A.C.; Caballero, B.; Cousins, R.J. Moderna nutrição na saúde e na doença. 10ª edição, São Paulo, Manole, 2009. 2222p.
4. UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos - TACO. 2011. Disponível em http://www.unicamp.br/nepa/taco.
5. USDA - United States Department of Agriculture Agricultural Research Service. USDA National Nutrient Database for Standard Reference. 2011. Disponível em: http://ndb.nal.usda.gov/ndb/search.
6. Wikipédia, a enciclopédia livre. Lactose.  http://pt.wikipedia.org/wiki/Lactose

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Coluna Nutrição: Batata doce...Há controvérsia sobre seus poderes!

Batata doce... Há controvérsia sobre seus poderes!

Maicon Martins Teixeira e Karla Silva Ferreira

A batata-doce, também denominada batata-da-terra, jatiba ou batata-da- ilha, é uma planta rústica, com baixo custo de produção e de fácil cultivo, tendo como principal característica o elevado teor de carboidrato. Portanto, é um alimento energético.

 Atualmente, ela ganhou muito espaço na mídia, sendo atribuída a ela a capacidade de propiciar ganho de massa muscular e reduzir a gordura corporal. Sendo assim, seu consumo aumentou imensamente, se tornando o alimento energético preferido, principalmente entre praticantes de atividades físicas.

Porém, esses atributos não são exclusivos da batata doce.  Ela é, sem dúvida, um bom alimento. Mas não superior a outros nestes aspectos.  Portanto, nosso objetivo neste texto é esclarecer suas reais vantagens. Na Tabela 1 são mostrados os teores de alguns nutrientes na batata doce, batata inglesa, inhame, abóbora e mandioca de acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Os dados de composição química de alimentos devem ser interpretados com cautela, pois a composição dos alimentos pode variar de acordo com a variedade, local de cultivo, grau de maturação, modo de preparo dentre outros fatores. Portanto, o alimento preparado em sua residência pode ter um valor nutritivo diferente do apresentado em uma tabela de composição de alimentos. O que podemos afirmar sobre a composição dos alimentos é que há grupos de alimentos que tem probabilidade de mais de 90% de ter quantidade expressiva de algum nutriente. Por isso, embora na Tabela 1 os teores de fibras, vitamina C e A relacionados à dados batata-doce, outros grupos de alimentos são fontes mais seguras destes nutrientes.

As principais fontes alimentares de vitamina A são as hortaliças e frutas amarelas, alaranjadas ou vermelhas e folhas verde escura. Exemplo é a abóbora, que é um fruto e cuja composição é apresentada na Tabela 1 para comparação. Quanto à vitamina C, as principais fontes são, indiscutivelmente, as frutas. A vitamina C é facilmente degradada quando o alimento é aquecido: quanto maior o tempo e temperatura de aquecimento, maior a extensão da degradação. Por este motivo, embora nestas tabelas haja vitamina C na batata doce e outros alimentos cozidos, o alimento preparado em sua residência pode não ter esta quantidade de vitamina C. Algumas frutas, como a laranja e a goiaba, possuem até quatro vezes mais vitamina A e C que a batata-doce. As frutas e hortaliças são também as principais fontes alimentares de fibras.

Outro nutriente que chama a atenção na Tabela 1 é o mineral cobre. Nota-se que a batata inglesa e a abóbora parecem conter elevados teores de cobre. Entretanto, as principais fontes dietéticas de minerais são as carnes e laticínios, que são também excelentes fontes de vitaminas do complexo B. As carnes são fontes de ferro, cobre, zinco dentre outros, exceto o cálcio. Os laticínios (queijo, leite e iogurte, principalmente) são as principais fontes de cálcio.






As raízes e tubérculos, como as batatas, mandioca, cará, batata baroa e inhame, se destacam, principalmente, como fontes de potássio e de carboidrato. São alimentos energéticos - estas são suas principais características. O inhame, por exemplo, é tão energético quanto à batata doce e a mandioca até um pouco mais. A batata doce, batata baroa e a cenoura são exceções quanto aos teores de vitamina A. A cenoura é um dos alimentos mais ricos nesta vitamina, podendo conter até 1000 microgramas em 100 gramas, além de ser também rica em fibras e ter baixíssimo teor de carboidrato e valor energético.

Provavelmente, o principal fator responsável pelo atual sucesso da batata-doce tenha sido a divulgação de que possui baixo índice glicêmico (IG). O IG mede a velocidade com que a glicemia aumenta (nível de glicose no sangue) após a ingestão de determinado alimento. Alimentos ricos em carboidratos e de mais fácil digestão têm, normalmente, um IG maior.

Em algumas situações, é recomendável a ingestão de alimentos com baixo índice glicêmico, por exemplo diabéticos, obesos e indivíduos com tendência a hipoglicemia. Isso porque quanto maior o IG, mais alta será a glicemia após a ingestão do referido alimento. Em consequência, maior será o estimulo para a secreção do hormônio insulina, que atua promovendo a captação da glicose do sangue para dentro das células. Como consequência, tem-se, dependendo da quantidade ingerida e requerimento energético, ganho de gordura corpórea e aumento do apetite. Os carboidratos dos alimentos com baixo IG são absorvidos lentamente, mantendo a glicemia mais baixa, estimulando a produção de insulina de forma menos intensa e dando saciedade por mais tempo.

Por outro lado, no caso de atletas e praticantes de atividade física, o recomendado é a ingestão de carboidratos de fácil digestão logo após a atividade física. Isso porque a primeira ordem do organismo após uma atividade física é repor o glicogênio muscular degradado. Após isso é que pode ocorrer a síntese de massa muscular e reposição das fibras musculares degradadas. Portanto, o melhor são alimentos com alto índice glicêmico após a atividade física intensa.

Caso a alimentação do atleta, após a atividade física, propiciar maior absorção de proteínas (ou aminoácidos) que de glicose, estes serão utilizados para fins energéticos e síntese de glicogênio. Pesquisas sobre alimentação dos índios e negros ressaltam que a base de sua alimentação eram alimentos ricos em carboidratos, tais como o cará e a mandioca. Estes indivíduos possuíam elevada resistência física e corpo musculoso. Este fato é explicado à luz da bioquímica. A síntese de massa muscular é resultado de atividade física e alimentação balanceada. Em uma alimentação balanceada, a maior proporção da energia deve vir de carboidratos, que além de fornecer energia, participam na desintoxicação do organismo e da síntese de grande parte das proteínas. Por outro lado, se a ingestão de proteína for elevada demasiadamente, ela será usada como fonte de energia em lugar dos carboidratos, o que resultará em maior formação e excreção de uréia. Esta precisa ser excretada pela urina e para dissolve-la é necessária maior quantidade de água, o que pode desidratar o indivíduo.
Esta consequência desidratante do excesso de proteína na alimentação é facilmente observada na rápida e elevada perda de peso logo que se começa uma dieta pobre em carboidrato e rica em proteína – às vezes perca quatro quilos na primeira semana.

De acordo com o livro A Dieta de Índice Glicêmico, escrito por Rick Gallop e publicado em 2006, o índice glicêmico (IG) da batata-doce é 77, o da batata inglesa é 121 e do inhame é 73. Porém, Foster-Powell et al. (2002) fizeram uma vasta revisão sobre índice glicêmico de alimentos. Estes pesquisadores encontraram 5 estudos realizados com batata doce nos quais o IG variou de 44 a 78. Sobre a batata inglesa, 23 estudos e o IG variou de 23 a 101. Com o inhame, 6 estudos com o IG variando de 21 a 68. Sobre a mandioca, apenas 1 estudo e IG de 46; sobre a abóbora também apenas um estudo e IG variando de 66 a 84. Sobre o cará seis estudos com IG de 21 a 63.

Alguns fatores são determinantes para reduzir o IG dos alimentos, como a presença de fibras e gorduras em sua composição. Considerando que não foram incluídos nas faixas de IG destes alimentos os fritos, mas apenas os cozidos, pode-se deduzir que a variação no IG é dependente da variedade do vegetal, que leva a diferenças na composição química dos mesmos. Algumas variedades de batata inglesa podem ter IG até menor que o de algumas variedades de batata doce.  Deve-se ainda prestar atenção no inhame e no cará, que podem possuir IG até menor que a batata doce.





Portanto, apesar de toda a fama da batata doce, ela é um alimento energético e que possui um índice glicêmico mais baixo que a maior parte das variedades de batatas inglesas e mandiocas. Isso a torna um alimento apropriado para dietas visando controle da glicose sanguínea e perda de peso.

Entretanto, contar com ela como fonte de vitamina C e de vitamina A não é conveniente, bem como atribuir a ela capacidade milagrosa ou exclusiva em aumentar a massa muscular. Uma alimentação balanceada e completa, contendo as quantidades necessárias de frutas, hortaliças, laticínios, carnes e, ou similares, azeite, leguminosas e cereais, é o mais indicado para quem quer estar em forma e saudável.

Referências bibliográficas

1- BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária/ANVISA: Resolução RDC nº 269 de 23 de setembro de 2005. Regulamento técnico sobre a ingestão diária recomendada (IDR) de proteína, vitaminas e minerais. 2005.
2- Gallop, R. Dieta do índice glicêmico. Editora: Sextante, V.1, 144 páginas, 2006.
3- NELSON, D. L.; COX, M. Lehninger – Princípios de Bioquímica. 3ed. São Paulo: Sarvier, 2002. 1009p.
4- Powell, KF; Holt, SHA; Miller, JCB.  International table of glycemic index and glycemic load values: 2002. Am J Clin Nutr. V.75, p 5-56, 2002.
5- USDA – Agricultural Research Service United Strates Department of Agriculture. Disponível em : http://ndb.nal.usda.gov/ndb/foods. Acesso: 8 de janeiro de 2015.
6- UNICAMP. TACO - Tabela Brasileira de Composição de Alimentos. 4 ª edição revisada e ampliada. Campinas, SP: UNICAMP, 2011.
7- Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: www.wikipedia.org.  Acesso: 13 de janeiro de 2015.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Coluna Nutrição - Frutose: o pior dos açúcares





Frutose: o pior dos açúcares


Karla Silva Ferreira, Maicon Martins Teixeira e Luis Fernando Miranda da Silva*

As substâncias que dão gosto doce aos alimentos são os açúcares, dentre os quais, os principais são a sacarose, a frutose e a glicose. A frutose é o mais doce dos açúcares e também o mais solúvel em água, o mais reativo e o mais rapidamente metabolizado. Raramente é encontrado sozinho nos alimentos, mas sim na forma de derivados como a sacarose, que pode ser a principal fonte de frutose de sua dieta. A sacarose é o açúcar comum (refinado, cristal ou mascavo) e é formada por 50% de glicose e 50% de frutose. Portanto, cada colher de sopa de sacarose (aproximadamente 10 gramas) tem 5 gramas de frutose.

O comportamento da frutose no organismo é diferente do da glicose, pois não necessita da insulina para entrar nas células. Essa facilidade de ser captado pelas células é que o faz ser mais rapidamente metabolizado e convertido em outras substâncias, tais como gordura, glicose e ácido úrico. Também por este motivo foi recomendado para diabéticos como adoçante, particularmente na fabricação de doces.



C6H12O6
Molécula de frutose e sua fórmula molecular: Na figura, as bolas cinzas são os carbonos; as brancas, os hidrogênios; e as vermelhas, os oxigênios. Fonte: www.pond5.com


O consumo em excesso de frutose está relacionado com diversos problemas de saúde, que vão aparecendo a curto, médio e longo prazos. Inicialmente,  favorece a síntese de novos lipídios, de glicose, de ácido úrico, aumenta o apetite e favorece o estresse oxidativo. Em seguida, os novos lipídios sintetizados são convertidos em lipoproteínas de muito baixa densidade, a glicose estimula a secreção de insulina, e o estresse oxidativo e o ácido úrico reduzem a produção de óxido de nitrogênio, composto importante para a redução da pressão arterial. A médio prazo, esses fatores levam à dislipidemia (triglicerídeos e colesterol elevados), obesidade com acúmulo de gordura visceral, baixa tolerância à glicose, hipertensão, disfunção endotelial e danos aos rins. A longo prazo, acarreta um quadro denominado “síndrome metabólica”, que é o diabetes tipo 2, doença cardiovascular e doença cerebrovascular. Consequentemente, aumenta o risco de demência e insuficiência renal crônica.

A American Heart Association recomenda a redução da ingestão de açúcares adicionados nos alimentos e estabeleceu como um limite prudente não mais que 25 gramas por dia para mulheres e 37,5 gramas para homens. Neste caso, os principais açúcares que a American Heart Association se refere são a sacarose, glicose e frutose.

Nos alimentos “in natura”, a frutose é encontrada na forma livre apenas nas frutas, hortaliças e no mel.  Nas frutas, seus teores são em torno de 2%, com poucas exceções chegando a 6,5% – 9,0%. Na maior parte das hortaliças seus teores são inferiores a 1%. As hortaliças mais ricas em frutose (berinjela, repolho, milho doce, cebola, pimenta, nabo e tomate) possuem entre 1,5% e 2%. O mel é uma exceção, sendo o alimento mais rico em frutose livre - possui em torno de 40%. Nas Tabelas 1 e 2 são apresentados os teores de frutose em alguns alimentos.





As organizações de saúde recomendam o consumo de três a cinco porções de frutas por dia. O tamanho da porção de fruta é a quantidade de fruta ou derivado que forneça 70 Kcal. Dentre as frutas mais comuns, o tamanho da porção varia de, aproximadamente, 70 gramas (uma banana) a 200 gramas (um copo de suco de laranja), estando a maior parte em torno de 130 gramas a 150 gramas (uma goiaba, uma maçã, uma pera, meio mamão papaya, um cacho de uva, uma laranja sem casca e dois kiwis pequenos, por exemplo). Desta forma, o consumo de três porções de frutas pode propiciar a ingestão entre 6 e 36 gramas de frutose. Com cinco porções de frutas, dificilmente a ingestão de frutose será maior que 60 gramas. Pode-se observar que a quantidade de frutose proveniente da ingestão de frutas não é elevada.

As principais fontes de frutose da dieta são os doces e as bebidas adoçadas com açúcar comum, xarope de milho e o mel. Por exemplo, uma barrinha de mariola de 22 gramas (doce de banana) ou uma fatia pequena de goiabada tem, aproximadamente, 8 gramas de frutose; um copo de 200 mL de refrigerante ou bebida açucarada tipo néctar, 10 gramas; uma colher de café de açúcar (3,0 gramas de açúcar) tem 1,5 gramas de frutose; e uma colher de sopa de mel (15 gramas de mel) tem 6 gramas de frutose. Uma boa dica para saber a quantidade de frutose em um alimento açucarado, tipo doce ou bebida, é dividir a quantidade de carboidrato ou açúcar declarada no rótulo nutricional por dois.

Com relação ao consumo de frutose, é interessante comparar o tempo de vida da abelha rainha com o tempo de vida das abelhas operárias e do que elas se alimentam. A abelha rainha é alimentada com geleia real, que possui uma composição mais variada e mais nutritiva que o mel. Ela vive mais de três anos. Já as abelhas operárias se alimentam exclusivamente de mel e vivem menos que dois. Embora o mel possa ter propriedades medicinais, como alimento é muito rico em açúcares, particularmente a frutose, o que não é benéfico para a saúde. Portanto, deve ser consumido com moderação.

*Os autores participam do projeto de extensão da UENF “Nossos alimentos: traduzindo a ciência na área de alimentos e nutrição”.

Referências bibliográficas

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3. Karalius, VP; Shoham, DA. Dietary Sugar and Artificial Sweetener Intake and Chronic Kidney Disease: A Review. Advances in Chronic Kidney Disease, 2013, v 20, p 157-164.
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6. USDA – Agricultural Research Service United Strates Department of Agriculture. Disponível em : http://ndb.nal.usda.gov/ndb/foods. Acesso: 8 de janeiro de 2015.
7. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: www.wikipedia.org.  Acesso: 13 de janeiro de 2015.
8. NELSON, D. L.; COX, M. Lehninger – Princípios de Bioquímica. 3ed. São Paulo: Sarvier, 2002. 1009p.
9. Damodaran, S; Parkin, KL; Fennema, OR. Química de alimentos de Fennema, 4ª  ed, ARTMED, 2010, 900 p.

terça-feira, 24 de março de 2015

Coluna Nutrição - Cromo: o mineral que está na moda




Cromo: o mineral que está na moda

Luiz Fernando Miranda da Silva e Karla da Silva Ferreira

Já está comprovado que o cromo é importante para a normalização da taxa de glicose no sangue (1, 2, 3), e há estudos indicando que pode ser importante para a síntese de proteínas musculares (4,5).
Comumente encontrado na natureza, o cromo se apresenta em dois principais estados de oxidação: o Cr+6 e o Cr+3. O Cr+6 é tóxico ao ser vivo e abundante em água e solo contaminado com resíduo industrial. O Cr+3, porém, naturalmente presente nas células animais, exerce nelas o efeito potencializador da ação da insulina, resultando em melhor captação de glicose sanguínea (4). Em humanos foi comprovado que a ausência de cromo na dieta de pessoas saudáveis eleva o nível de glicose no sangue acima da faixa de normalidade (99 mg/dL) (5,6), que, por sua vez, retorna aos valores normais após a ingestão regular do mineral (5).
Sabendo de sua importância à saúde, o Comitê de Nutrição dos EUA (Food Nutrition Board) estabeleceu, em 1989, que a ingestão diária de 35 microgramas seria suficiente para evitar aumentos indesejados de glicose no sangue em pessoas sem doenças e em adequado estado nutricional. Com base nesta recomendação, o Comitê considerou que, pelo menos, 50% da população teriam suas necessidades nutricionais de cromo atendidas. O ideal seria que houvesse uma recomendação que atendesse quase toda a população, no entanto, seriam necessários mais estudos sobre a função deste nutriente e se o mesmo é consumido habitualmente pelas pessoas. Sem estas pesquisas, fica impossível determinar a quantidade de cromo que certamente prevenirá a deficiência nutricional de indivíduos saudáveis (7).

Embora este mineral seja estudado há quase um século, foi a partir da década de 90 que as investigações de suas funções metabólicas ganharam mais notoriedade em função de novas descobertas, por exemplo, o favorecimento à síntese de proteína muscular (4). Por conta disto, pesquisas sobre o teor de cromo nos alimentos ganharam mais importância a partir de 2001, principalmente na Europa. Com base em alguns estudos, cientistas adquiriram mais conhecimento sobre a quantidade de cromo ingerida pela população, e se isto seria o suficiente para prevenir doenças, como o diabetes tipo II (11, 12,13, 14). Contudo, a hipótese de deficiência nutricional de cromo não está rechaçada na maioria dos países, em função do pouco conhecimento produzido no que tange à presença deste micronutriente nos alimentos.
Mesmo sem conhecimento sobre composição nutricional de alimentos e ingestão dietética de cromo, muitas empresas do ramo alimentício comercializam suplementos enriquecidos com cromo prometendo emagrecimento, ganho de músculos e melhor desempenho físico (16). No entanto, ainda não existem estudos que permitam confirmar este efeito.
Tendo em vista a escassez de estudos sobre este mineral no Brasil, pesquisadores da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Laboratório de Tecnologia de Alimentos) quantificaram o teor de cromo em 200 tipos de alimentos consumidos no país (17). Na tabela abaixo, encontra-se o teor em alguns alimentos ricos em cromo. Tendo ciência destes resultados, é possível estimar a quantidade de cromo consumida pela população, saber se atende à recomendação nutricional (35 μg de Cr/dia), além de servir como base para novas diretrizes. 




Referências bibliográficas

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15. SILVA LFM (2010). Avaliação de produtos alimentares comercializados para fins especiais. [dissertação]. Campos dos Goytacazes (RJ) Universidade Estadual do Norte Fluminense.
16. SILVA, LFM (2014). Teor de cromo em alimentos e ingestão dietética de cromo por atletas de basquetebol. [Tese]. Campos dos Goytacazes (RJ) Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. 72p.

sexta-feira, 13 de março de 2015

Coluna Nutrição - Afinal, comer ou não alimentos com glúten?




Afinal, comer ou não alimentos com glúten? 

Luiz Fernando Miranda da Silva
Karla Silva Ferreira

Aquele indivíduo com diarreia aguda acompanhada de dor e desconforto abdominal após comer alimentos contendo centeio, trigo ou cevada, pode apresentar reação autoimune ao glúten, denominada doença celíaca1, ou terem a síndrome Não Celíaco Sensível ao Glúten (NCGS), transtorno proposto em 2012 na Alemanha, na Segunda Reunião entre Especialistas em Sensibilidade ao Glúten (2,3).

Embora não se tenha estimativa concisa sobre o número de habitantes NCGS, acredita-se que seja maior do que os acometidos pela doença celíaca (1%). Nos EUA, a doença celíaca afeta 1,13% da população (1) e, no Brasil, dependendo da região, afeta entre 0,5% e 1,9% da população (4). Pessoas com pais ou avós doentes celíacos possuem maior chance de ter a doença, sem que necessariamente, apresente sintomas de sensibilidade (5).

O glúten está presente em quase todos os alimentos derivados de grãos de trigo, aveia, centeio e cevada, como pão, massas, biscoitos, bolos e torradas. O grão do trigo, assim como os demais cereais citados, contém no endosperma (tecido de reserva de nutrientes) o complexo de proteína chamada glúten (6) formado por duas proteínas: a gliadina e glutenina (Fig 1 e 2).  Quando misturado à água, o glúten forma uma massa viscosa e elástica capaz de aprisionar o gás carbônico produzido durante a fermentação, conferindo a textura e aparência característica do pão e bolos de trigo. Existem produtos não derivados dos cereais citados acima que possuem glúten como aditivo alimentar que lhe confere propriedade coesão-adesão (7) (ex.: cárneos triturados e do tipo surimi para produção de kani (7) e até em temperos (8)).




Quando ingerido, algumas frações peptídicas da gliadina oriundas da digestão parcial do glutén são reconhecidas pelas células linfocíticas T CD4+ desencadeando resposta inflamatória autoimune, causando em médio e longo prazo dano ao tecido intestinal, achatamento da mucosa e queda na capacidade da mesma em absorver nutrientes, resultando em diarreia, dor abdominal, produção excessiva de gases, anemia, osteoporose, baixo crescimento e, ou desnutrição (1,3,12).

O diagnóstico da doença deve ser feito por médicos e não é simples, uma vez que os sintomas se confundem com outras doenças inflamatórias intestinais (1). Portanto, é preciso investigar o estado nutricional do paciente, principalmente bioquímico (ferro, vitamina B12 é ácido fólico) (12), sobretudo a presença de anticorpos antigliadina, antiendomísio e antitransglutaminase nas secreções intestinais (5). Ainda assim, a biopsia intestinal antes e após a retirada do glúten na dieta é definitivo (5,1).

Recomenda-se aos pacientes sensíveis ou alérgicos ou glúten a  isenção do mesmo da dieta, mas isto pode ser difícil, uma vez que os produtos à base de cerais estão presentes em diversos alimentos preparados. Alguns doentes em tratamento abandonam a dieta (30%) (13) podendo não apresentar sintomas significativos, ao passo que outros são mais sensíveis e podem ter reação aguda mesmo ingerindo pequena quantidade de alimentos com glúten. Ou seja, o grau de tolerância varia entre estes doentes.  Desta forma, o ideal é a isenção de glúten dietético e promover a vigilância do que ingere, por exemplo, lendo os rótulos nutricionais na secção “ingredientes”.

Na figura 3 é apresentado um rótulo nutricional referente a um bolo. Observe que, além da informação nutricional, são apresentados os ingredientes utilizados em sua fabricação seguidos da frase “Contém glúten”. Nota-se que o produto contém farinha de trigo e, por sua vez, o glúten. Segundo a Lei Federal no 10.674, todos os fabricantes da indústria alimentícia devem escrever nas embalagens de todos os alimentos industrializados se o alimento contém ou não o glúten (5).



Trigo, cevada, centeio e aveia são as principais fontes de glúten (12), e cada glúten possui complexo de proteína peculiar. No trigo está presente a gliadina, na cevada a hordeína (14), e no centeio a secalina (15). O efeito tóxico causado por estas prolaminas está associado à gliadina e hordeína. Sobre a secalina há poucas evidências (15) e sobre a avenina há evidências de que quantidade limitada não é prejudicial aos doentes sensíveis ao glúten. Para verificar o efeito dietético da avenina, pesquisadores finlandeses mostraram que a ingestão diária de 49 g de aveia não provocou efeito adverso na mucosa intestinal em doentes celíacos diagnosticados (16), e, em 2014, a Associação Celíaca Canadense se posicionou a favor do consumo diário de até 70 g de aveia como seguro aos doentes celíacos (17). No Brasil, ainda não existe parecer semelhante.

Está na moda a dieta sem glúten e a recomendação para a restrição do consumo vinha sendo adotada de forma indiscriminada, o que levou o Conselho Regional de Nutricionistas (CRN-3) a promover um encontro científico para a discussão do tema no Brasil. Neste encontro ficou acordado que a eliminação do glúten da dieta só deve acontecer mediante diagnóstico clínico confirmado de doença celíaca, de dermatite herpetiforme, de alergia ao glúten, ou quando, eliminada a hipótese de doença celíaca, haja diagnóstico clínico confirmado por médicos de sensibilidade ao glúten (intolerância ao glúten–não celíaca ou NCGS).

Embora a dieta sem glúten contribua para o emagrecimento, uma vez que há menor ingestão de alimentos ricos em carboidratos tornando mais fácil o alcance do déficit energético, e, portanto, a perda de gordura corporal, a prática não é recomendada para este fim pelo risco de prejuízos à saúde, como perda de músculos e deficiência nutricional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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