segunda-feira, 27 de agosto de 2018

Coluna Nutrição: Dieta Vegana: um potencial risco à saúde ou melhoria dela?



Dieta Vegana: um potencial risco à saúde ou melhoria dela?


Karina de Oliveira Alves, Karla Silva Ferreira e Luiz Fernando Miranda da Silva


Uma dieta vegetariana é baseada principalmente em frutas, verduras, legumes, oleaginosas, grãos e sementes. Alguns vegetarianos (ovolactovegetarianos) consomem leites e derivados e ovos, porém uma dieta vegana possui maiores restrições. O alimento vegano engloba produtos sem nenhum ingrediente de origem animal e não se limita apenas aos alimentos nos quais os animais precisam ser abatidos. Produtos lácteos, ovos, mel, entre outros não fazem parte de um cardápio vegano. Existe uma considerável ascensão de indivíduos que aderiram essa prática em países industrializados, principalmente em jovens do sexo feminino. Nos últimos anos, nos Estados Unidos houve um aumento do ano de 1997 de 300.000 para entre 2,5 e 6 milhões de veganos em 2012 (1 a 2% da população dos EUA).

A partir desses dados têm-se motivos para acreditar que a inclusão desses produtos no setor alimentício e nos padrões de consumo alimentar continuará a crescer. O veganismo tem ganhado popularidade como opção alimentar saudável e possivelmente terapêutica.

São diferentes as razões para adotar esse estilo de vida, dentre elas são incluídas a preocupação ambiental, aversão alimentar, influência de outras pessoas, preocupação com a ética animal e a saúde. Os dois últimos motivos são os mais prevalentes para a adoção de uma dieta vegana. Os relatos de benefícios da prática vegana para a saúde são bem extensos e documentados em diversos estudos. Essa população específica tende a apresentar menores índices de IMC (Índice de Massa Corporal, que abaixo de 18,5 indica possibilidade de desnutrição e quanto maior que 25 corresponde a maior porcentagem de gordura corporal), menores taxas de colesterol ruim (LDL - lipoproteína de baixa densidade), melhor controle da pressão sanguínea, menores taxas de doenças cardiovasculares e diabetes.

Há também relatos de benefícios da dieta vegana e vegetariana na prevenção de diversos tipos de neoplasias, como o câncer de próstata, estômago e cólon. Portanto, essa dieta pode ter um potencial terapêutico para tratamento de patologias relacionadas à síndrome metabólica e pode também conceder benefícios contra condições inflamatórias como a artrite reumatoide.

Há uma relação entre a dieta e a microbiota intestinal nos indivíduos. Os veganos mostram ter uma microbiota diferente em relação aos onívoros, porém não possui uma distinção muito significativa da microbiota de vegetarianos. O perfil intestinal vegano mostra-se com uma redução de bactérias patogênicas e uma expansão de bactérias protetoras. As condições minimizadas de inflamação podem ser a característica fundamental que associa a microbiota intestinal vegana aos benefícios protetores da saúde. Entretanto, vale ressaltar que os alimentos com maior potencial de fermentação (causar gases) estão no grupo dos carboidratos e devem ser excluídos em casos de extrema e incômoda formação de gases.

Será que pessoas onívoras, que buscam uma alimentação saudável, conseguem atingir os resultados positivos das dietas vegetarianas? Há poucos estudos que comparam rigorosamente os onívoros, vegetarianos e veganos. Deste modo é difícil ponderar se os benefícios atribuídos à dieta vegana podem ser aplicados também à dieta vegetariana ou até mesmo para uma dieta onívora saudável. Entretanto, semelhante às dietas vegetarianas e veganas, dietas que possuem quantidades moderadas de produtos de origem animal podem ser benéficas à saúde. A dieta mediterrânea, por exemplo, é considerada altamente saudável e nutritiva. Nela estão incluídos frutas, verduras, nozes e peixes. É também apontada como preventiva para o surgimento de Diabetes tipo II, algumas doenças neurodegenerativas e neoplasias. A dieta mediterrânea também é destacada por ter um baixo impacto ambiental, bem como a dieta vegana.

O veganismo é capaz de apresentar escolhas não saudáveis, visto que alimentos ricos em açúcares, sal e gorduras “trans” podem ser rotulados como veganos e não apresentar nenhum tipo de benefício para a saúde. Um estudo feito através de uma pesquisa online internacional, constatou que os indivíduos que aderem à dieta por motivos de ética animal tendem a fazer escolhas não saudáveis e aqueles que aderiram ao veganismo para obter melhoras na saúde optam por melhores escolhas alimentares e se atentam para outros comportamentos que influenciam em mais saúde e qualidade de vida.

Embora existam evidências que indiquem benefícios diversos à saúde relacionados à uma dieta vegana, a exclusão de todos os alimentos de origem animal pode acarretar deficiências de micronutrientes importantes, como a vitamina B12, os ácidos graxos ômega-3 EPA (ácido eicosapentaenoico) e o DHA (ácido docosahexaenóico), a vitamina D, o cálcio, o ferro e o zinco. A Figura 1 ilustra um prato típico vegano com a relação das possíveis deficiências nutricionais.



Vitamina B12: os primeiros sintomas da falta de B12 podem ser algo inespecífico, como fadiga e problemas digestórios. A manifestação de sinais neurológicos e hematológicos pode ser sutil.  Uma deficiência de B12 a longo prazo pode ocasionar problemas graves como a anemia perniciosa, acidente vascular cerebral e doenças cardiovasculares. Os veganos possuem concentrações plasmáticas mais baixas de vitamina B-12, o que pode levar a uma deficiência desse micronutriente e maiores concentrações de homocisteína plasmática. Os níveis séricos abaixo de 190 pg/mL estão associados ao risco de deficiência e, por consequência, elevação de homocisteína. A elevação da homocisteína é considerada como fator de risco para doenças cardiovasculares. Para evitar deficiência de B12, a população vegana deve consumir regularmente alimentos fortificados ou tomar suplementos vitamínicos. Nenhum alimento de origem vegetal que não seja fortificado contém quantidade de B12 que possa ser expressiva para que o indivíduo atinja os níveis ideais desta vitamina.

Os seguintes aspectos sobre a vitamina B 12 merecem ser ressaltados: é essencial apenas para animais; é produzida apenas por microrganismos; alguns destes microrganismos produtores de vitamina B12 habitam o intestino dos animais; parte da vitamina B12 produzida no intestino dos animais é absorvida; no caso do ser humano, a quantidade de vitamina B12 produzida pelos microrganismos do intestino não é suficiente para suprir as necessidades desta vitamina B12; alimentos de origem vegetal não possuem naturalmente vitamina B12; indivíduos adultos vegetarianos são mais propensos a desenvolver anemia por deficiência de vitamina B12 dos que as crianças vegetarianas pelo fato de as crianças serem mais descuidadas com os hábitos higiênicos.

Os ácidos graxos ômega-3 EPA e DHA: são importantes para a saúde cardiovascular, ocular e cerebral. As principais fontes destes ácidos graxos são peixes, ovos e vegetais do mar. Os animais, inclusive os seres humanos, conseguem produzir pequenas quantidades destes ácidos graxos a partir do ácido linolênico, encontrado, principalmente, em linhaça, soja, canola, nozes e seus derivados oleosos, tais como os óleos de canola e soja. Entretanto, a quantidade produzida é pequena para produzir os efeitos benéficos que são produzidos quando há ingestão deles já prontos, seja por meio da ingestão de alimentos ou suplementos.

Indivíduos veganos devem consumir regularmente alimentos vegetais ricos em ácido linolênico, como por exemplo sementes moídas de linhaça e nozes, mas também alimentos enriquecidos com EPA e DHA já prontos, tais como alguns tipos de leite de soja e cereais. As pessoas que possui maiores necessidades destes ácidos graxos, como mulheres grávidas e lactantes, podem se beneficiar com a suplementação dos mesmos.

Vitamina D: a forma de vitamina D predominantemente encontrada na dieta dos veganos é a D2, que apresenta menor biodisponibilidade em comparação à D3, que é derivada de produtos de origem animal. A quantidade de vitamina D no corpo desses indivíduos depende da exposição ao sol e da ingestão de alimentos fortificados com essa vitamina.  Para uma ingestão adequada de Vitamina D, alimentos enriquecidos devem ser incluídos na dieta. Nos lugares onde não há disponibilidade de alimentos enriquecidos com vitamina D, a suplementação é recomendada.

Cálcio: as principais fontes alimentares de cálcio são o leite e seus derivados, com exceção da manteiga, e os alimentos enriquecidos. Poucos alimentos vegetais são fontes de cálcio, seja por terem baixos teores de cálcio ou pelo fato de suas porções alimentares serem pequenas. Portanto, cuidados quanto ao aporte de cálcio também devem ser tomados. Fontes alimentares vegetais de cálcio devem ser diariamente incluídas na dieta, como vegetais verdes escuros, tofu e tahine.

Ferro e zinco: os minerais como ferro e zinco precisam ser levados em consideração. É bem conhecido o fato de que o ferro contido nos alimentos de origem vegetal é de baixa absorção e que a ingestão simultânea de vitamina C aumenta sua absorção. Os veganos tem possibilidade de ter ingestão entre adequada e elevada de vitamina C, uma vez que as melhores fontes alimentares de vitamina C são as frutas e hortaliças folhosas.  Entretanto, as concentrações séricas de ferritina (proteína que armazena e transporta o ferro no sangue) de alguns veganos são similares aos de vegetarianos, porém inferiores aos de onívoros. Outra deficiência mineral que pode ser encontrada em veganos é de zinco. A absorção do zinco é prejudicada pela presença de fitatos, substancias comumente presentes nos cereais integrais, são alimentos importantes nas dietas veganas. Por outro lado, os cereais integrais, produtos derivados da soja e leguminosas são fontes de zinco.  Algumas técnicas de preparo dos alimentos, tais como a fermentação (uso de fermento para a fabricação de pães integrais) e deixar o cereal ou a leguminosa de molho contribuem para a redução dos teores de fitatos.

Para auxiliar na escolha de alimentos para uma dieta vegana, são apresentados na Tabela 1 os alimentos que são boas fontes dos nutrientes que costumam estar deficientes neste tipo de dieta.





Uma dieta vegetariana pode ser saudável, mas isso depende dos tipos e quantidades de alimentos que a compõem.  Do contrário, pode ser desequilibrada e levar a deficiências nutricionais, conforme descrito anteriormente. Isso também ocorre com dietas onívoras desequilibradas. Um planejamento alimentar cuidadoso pode fazer com que dietas veganas atendam às necessidades nutricionais além de potencializar a ingestão de substancias benéficos presentes em alimentos de origem vegetal. A orientação de um profissional qualificado em nutrição pode ser essencial nos casos em que a pessoa queira seguir dietas sem riscos de trazer problemas para sua saúde.

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