Dieta low carb
Suelen Galante Inácio, Sâmela Oliveira Barbosa e Karla Silva Ferreira
A 'dieta low carb” está na moda. Muitas pessoas procuram um nutricionista pedindo uma dieta “
low carb”. Afinal, o que é uma dieta low carb? Este tipo de dieta emagrece? Faz bem para a saúde? Pode ser seguida por qualquer pessoa?
Ainda não existe uma definição precisa do que seria uma dieta low carb. Na tradução do termo em inglês,
low carb significa baixo carboidrato. Portanto, seria uma dieta com restrição de carboidratos. Na prática, supõe-se que a restrição de carboidratos direcionaria o organismo para utilizar gordura como fonte de energia. Entretanto, para isso ocorrer, a ingestão de carboidratos deveria ficar entre 50-150 gramas por dia (Westman et al., 2007). Por outro lado, alguns estudiosos acreditam que uma dieta com baixo teor de carboidrato seria aquela na qual os carboidratos fornecem menos que 45% das calorias diárias (Brouns, 2018). Por exemplo, em uma dieta com 2000 Kcal a quantidade de carboidrato máxima, para fornecer 45% do valor energético, seria 225 gramas. Lembrando que cada grama de carboidrato fornece 4 Kcal. Portanto, 225 gramas fornecerão 900 Kcal.
É importante salientar que as dietas com menos carboidrato levam à mudança no equilíbrio dos nutrientes, acarretando maior consumo de gordura e de proteínas (Naude et al., 2014), como mostrado na Figura 1.
Embora as dietas
low carb não sejam dietas com exclusão completa de carboidratos, os alimentos selecionados para ela são alimentos em geral com baixo teor de carboidratos e elevados teores de gordura ou proteínas. Ressalta-se que não há exclusão do carboidrato, mas moderação do consumo de suas fontes dietéticas. Na Figura 2 são apresentados alimentos usuais em refeições com quantidades normais de carboidrato e refeições low carb.
Nas dietas com restrição de carboidrato, há consumo de todos os queijos, incluindo os amarelos, manteiga, ovos, castanhas, nozes, carnes de todos os tipos, frutas, gorduras e frutas com baixas quantidades de carboidrato. Já na dieta com maior proporção de carboidratos, são incluídas frutas ricas em carboidratos, cereais integrais, raízes, queijos brancos e carnes magras. Observe que, mesmo na dieta
low carb, o arroz integral permanece, uma vez que este tipo de dieta não exclui o carboidrato, apenas o reduz. Outros alimentos ricos em carboidratos, tais como feijão, batata, macarrão, aveia etc., podem fazer parte da alimentação de baixo teor de carboidrato, desde que consumidos na quantidade correta.
Dieta low carb e perda de peso
Os estudos sobre dieta
low carb e perda de peso apontaram o seguinte:
1)
qualquer tipo de dieta que diminua o consumo de energia (calorias) resultará em perda de peso e mudanças favoráveis nos exames e funções orgânicas (Westman et al., 2007). Na prática, as dietas
low carb são mais restritas quanto aos tipos de alimentação, o que favorece menor consumo de alimentos e, consequentemente, menor ingestão energética e maior perda de peso, principalmente nas primeiras semanas ou meses seguindo esta dieta.
2) a adesão prolongada a uma dieta
low carb (que é também cetogênica) parece ser difícil. Uma dieta não cetogênica, fornecendo 100-150 gramas de carboidrato por dia, pode ser mais prática e fácil de ser seguida (Brouns, 2018).
3) não há resultados de pesquisas que apoiem a eficácia, a segurança e os benefícios para a saúde das dietas
low carb longo prazo (Brouns, 2018).
4) estudo comparando dieta
low carb versus dieta com baixo teor de gordura, com a mesma quantidade de calorias, mostrou que estas dietas não apresentam resultados diferentes em relação à perda de peso, pressão arterial, glicemia de jejum, insulina, resistência à insulina e proteína C-reativa. Por outro lado, nas dietas
low carb houve maiores reduções nos triglicerídeos e aumento no colesterol HDL (bom colesterol), mas também do LDL (colesterol ruim) (Wycherley et al., 2010).
5) as dietas com restrição de calorias e com quantidades normais ou reduzidas em carboidrato resultaram em similar perda de peso e maior proteção para doenças cardiovasculares, porém não acarretaram diferenças na pressão arterial, LDL, HDL, colesterol total, triglicerídeos e glicemia de jejum (Naude et al., 2014).
Os estudiosos concluíram que as dietas com baixo teor de carboidratos parecem ser tão eficazes quanto as dietas com baixo teor de gordura para a perda de peso, desde que ambas sejam com baixo valor energético. No entanto, os efeitos benéficos à saúde (perda de peso, redução de glicemia e aumento do colesterol bom) e os efeitos negativos (aumento do colesterol ruim) devem ser avaliados individualmente.
Ingestão de proteína e dieta low carb
Quando se propõe uma redução do teor de carboidrato há um aumento proporcional da gordura e da proteína na alimentação. O papel da proteína nesse processo de perda de peso deve ser melhor explorado.
O efeito da dieta
low carb ou com alto teor de proteínas foi comparado em um estudo no qual foram administradas dietas com baixa versus normal ingestão de carboidratos e alta versus normal ingestão de proteína. Os resultados demonstraram que, apesar de todas as quatro dietas promoverem a perda de peso, uma quantidade relativamente alta de proteína apresentou melhores resultados que a baixa ingestão de carboidratos. Até mesmo uma dieta com quantidade normal de carboidratos, mas alta em proteína mostra melhor manutenção de peso. A dieta rica em proteína demonstrou ainda provocar redução da ingestão energética. Aparentemente isso demonstra que esse tipo de dieta levou a aumento da saciedade, embora este parâmetro não tenha sido avaliado diretamente (Johnstone et al., 2008).
Para perda e manutenção do peso, depende-se tanto da saciedade como da preservação da massa magra. A ingestão adequada de proteína ajuda a satisfazer essas duas condições. Portanto, a ingestão de proteína deve ser mantida dentro do recomendado, mesmo com a restrição energética. Além disso, a ingestão adequada de proteínas é benéfica para a composição corporal, melhora a pressão arterial e reduz o risco de recuperar o peso. O sucesso da dieta
low carb, que é rica em proteínas, pode ser atribuída mais ao conteúdo relativamente alto de proteína do que à restrição de carboidratos (Westerterp-Plantenga et al., 2012).
Dieta low carb e risco à saúde
Com a popularidade das dietas
low carb e consequente redução no consumo de carboidratos, há probabilidade de que alguns grupos populacionais tenham ingestão deficiente de ácido fólico.
A deficiência de ácido fólico durante a gestação acarreta má formação do feto, causando, especificamente, anencefalia e espinha bífida, conjuntamente denominadas de “defeito do tubo neural”. A anencefalia é a ausência de cérebro e as crianças com esta má formação nascem mortas ou morrem logo após o nascimento. A espinha bífida é o não fechamento da coluna vertebral. As crianças com esta má formação podem apresentar diversos problemas, tanto físicos como no funcionamento do organismo, tais como problemas intestinais, renais, neurológicos, paralisia dos membros inferiores, problemas ortopédicos dentre outros, e irão requerer cuidados especiais durante toda a vida.
O ácido fólico é uma vitamina encontrada principalmente em vegetais folhosos. Em sua forma natural, é facilmente destruída durante o cozimento dos alimentos, o que contribui para tornar sua deficiência um sério problema de saúde pública em todo o mundo. Para prevenir esta doença, diversos países e inclusive o Brasil tornaram obrigatório o enriquecimento das farinhas de trigo e de milho com uma forma de ácido fólico resistente ao calor. Sendo assim, a ingestão destas farinhas e de alimentos preparados com elas é uma forma de garantir o consumo adequado de ácido fólico e a prevenção do nascimento de crianças com má formação do tubo neural. Portanto, se gestantes excluírem estes alimentos de suas dietas, o objetivo do enriquecimento destas farinhas pode ser perdido.
Para sanar esta dúvida, um grupo de pesquisadores desenvolveu uma pesquisa avaliando a ingestão alimentar de gestantes e o estado de saúde dos bebes após o nascimento. A ingestão de ácido fólico entre as mulheres com restrição de carboidratos foi menor do que as mulheres que ingeriam carboidrato normalmente. As mulheres com ingestão restrita de carboidratos tinham 30% mais chances de ter filhos com anencefalia ou espinha bífida (Desrosiers et al., 2018). Sendo assim, fica o alerta para a população: a restrição do consumo das farinhas de trigo, de milho e seus derivados pode acarretar ingestão inadequada de ácido fólico, cuja deficiência causa problemas seríssimos e irreversíveis para o “bebê”.
Conclusões
1)
Não existem evidências científicas que indiquem uma superioridade da dieta
low carb frente a outros tipos de dieta para a perda de peso. A restrição energética (de calorias) parece ter o papel principal na perda de peso, independente do tipo de dieta adotado.
2)
Dietas restritas em carboidrato são mais efetivas nas primeiras 12 semanas, mas, com o passar do tempo, seu efeito na perda total de peso se iguala a outras dietas.
3)
A exclusão de farinha de trigo, farinha de milho e seus derivados pode acarretar deficiência de ácido fólico.
4)
Algumas publicações indicaram que a dieta
low carb, por aumentar a proporção de gordura na dieta, leva a aumento de LDL colesterol (colesterol ruim).
5)
Não apenas a restrição de carboidratos e de energia, mas também ingestão elevada de proteínas parece ter papel importante na perda de peso.
Referências bibliográficas
1)
Desrosiers, TA, Siega-Riz, AM, Mosley, BS, Meyer, RE. Low carbohydrate diets may increase risk of neural tube defects. National Birth Defects Prevention Study. (2018) 25-33.
2)
Brouns, F. Overweight and diabetes prevention: is a low-carbohydrate–high-fat diet recommendable? Eur. J. of Nutr. (2018) 57:1301–1312.
3)
Johnstone, AM, Horgan, GW, Murison, SD, Bremner, DM, Lobley, GE. Effects of a high-protein ketogenic diet on hunger, appetite, and weight loss in obese men feeding ad libitum. Am. J. Clin. Nutr. (2008) 87:44–55.
4)
Mansoor, N, Vinknes, KJ, Veierød, MB, British, KN. Effects of low-carbohydrate diets versus low-fat diets on body weight and cardiovascular risk factors: a meta-analysis of randomised controlled trials. J. of Nutr. (2014) 115:466–479.
5)
Naude, CE, Schoonees, A, Senekal, M, Young, T, Garner, P, Volmink, J. Low Carbohydrate versus Isoenergetic Balanced Diets for Reducing Weight and Cardiovascular Risk: A Systematic Review and Meta-Analysis. Plos one. (2014) 9:305-319.
6)
Westerterp-Plantenga, MS, Lemmens, SG, Westerterp, KR. Dietary protein – its role in satiety, energetics, weight loss and health. Brit. J. of Nutr. (2012)108:S105–S11.
7)
Westman, EC, Feinman, RD, Mavropoulos, JC, Vernon, MC, Volek, JF, Wortman, JA, Yancy, WS, Phinney, SD. Low-carbohydrate nutrition and metabolism. Am. J. Clin. Nutr. (2007) 86:276–84.
8)
Wycherley, TP, Brinkworth, GD, Keogh, JB, Noakes, M, Buckley, JD, Clifton, PM. Long-term effects of Weight loss with a very low carbohydrate and low fat diet on vascular function in over weight and obese patient. J. of Inter. Med. (2010) 267:452–461.